sexta-feira, 28 de outubro de 2016

~ My Surface ~



[... ] Arthur: E ele o que pensava disso? 
Laura: Não sei, ele dizia que, que eu tentava ler seus pensamentos, adivinhar o que ele estava pensando ou sentindo. Dessa vez, eu não quero isso. 
Arthur: E você, como se sente? 
Laura: Com o quê? 
Arthur: Com tudo isso, com o fato dele achar que você queria sempre adivinhar seus pensamentos, ou ao que parece, estar um passo a sua frente. 
Laura: Sinto-me uma péssima companhia. 
Arthur: Hum... Então ele te fazia mal? (Arthur cutucou desejando que ela assumisse que aquela relação não a fez bem)
Laura: Não, não é isso! (Titubeou) Ele me levava a extremos, entende? Despertava minha chateação, muitas vezes suas atitudes me corroíam, eu sei! Eu sei também que eu tinha péssimas atitudes, mas, ele não me fazia mal, não era ele. Os bons momentos superaram, tanto é que até quando estávamos brigados eu sentia falta dele. 
Arthur: (Arthur não se deu por vencido) Laura, essa relação te trouxe aqui, como algo bom pode te trazer a um lugar como esse? (Ele olhou ao redor como se quisesse mostrar algo a loira). 
Laura: Escute bem, eu vim aqui porque não posso lidar com a ausência dele, porque me dói saber que não tenho mais... (Ela parou de falar e seus olhos se encheram de lágrimas).
Arthur: O que você não tem mais, Laura? 
Laura: (Pigarreou) Eu não tenho mais a voz, o riso, e quanto ele dizia “eu te amo” e o mundo parecia entrar em uma pausa onde só eu e ele nos moviamos. Não posso mais compartilhar curiosidades sobre mim, ou ouvi-lo falar do quanto brigaria por palmito ou do seu amor louco por pão de alho. Não tenho mais com quem reclamar que comer miojo cru faz mal, nem sequer o tenho para discutir, me chatear ou qualquer coisa do tipo. 
Arthur: Quer dizer que as discussões fazem falta? 
Laura: Não! Ele me faz falta.  
Arthur: Então se ele não te fazia mal, se tudo era tão bom, por que se afastou? 
Laura: Porque nem todos suportam a intensidade. É como você colocar duas cargas diferentes juntas.  ( Laura parou e Arthur franziu a testa como se pedisse para que ela continuasse) Sabemos que cargas iguais se repelem, diferentes se atraem. É como um ser carga negativa e o outro positiva. Existe uma grande atração, mas imagine, uma hora eu estou em 220 volts, outra ele está em 110 volts. São energias diferentes passando pelos corpos que estão juntos, vai dar choque. (Ela suspirou) E é isso que acontece. Somamo-nos, mas por estarmos em intensidades diferentes, muitas vezes saímos machucados. E eu não quero isso pra mim, principalmente para ele. 
Arthur: (Arthur estava paralisado com a explicação de Laura, mas tentou não demonstrar tal desconforto. Ajeitou o corpo à cadeira, se recompôs e continuou) Então, se sente falta, por que não tenta mais uma vez? 
Laura: Não, Arthur. Às vezes é melhor dar uma pausa antes de tudo virar uma tragédia. Se for pra terminar algo, que termine com a beleza do que temos, não com a insistência em uma vida que acabará em uma triste discussão. 
Arthur: Isso soa dependência, Laura. Já parou pra pensar? Reflita sobre. Você não precisa viver assim, tem que continuar sem ele. 
Laura: Eu sei que posso, mas não quero. Não é dependência. Ele é a minha superfície. 
Arthur: Superfície? (Interrogou sem compreender o que Laura queria dizer).
Laura: Sabe quando estamos em uma praia, rio, piscina, qualquer lugar assim e mergulhamos, vamos lá no fundo, estamos prendendo a respiração, certo? (Arthur assentiu com a cabeça) uma hora precisaremos voltar à superfície para respirar. E ele é a minha superfície. Eu sempre precisava voltar para ele, sentia e sinto essa necessidade batendo forte dentro de mim (Sem notar, ela levou a mão ao coração). E agora, agora sem ele lá, eu não posso voltar...Eu sinto... (Laura fez uma pausa como se tivesse medo de falar). 
Arthur: Você sente que está se afogando? (E ele finalmente falou por ela). 
Laura: Sim. Na verdade, é como estar em um sonho. Eu sinto a água entrando em meus pulmões, o desespero se apossando de mim, eu não consigo voltar à superfície, e pouco a pouco vou me afogando, até que acordo e noto que... 
Arthur: Que? (Ele pareceu curioso).
Laura: Que o sonho é real. Já me afoguei, meu corpo está ali, mas minha alma não conseguiu voltar à superfície, e por dentro eu já morri. 

Arthur ia falar algo quando ambos olharam o relógio sobre a mesa. A hora com o psicólogo havia acabado e embora Laura tivesse mais a dizer e Arthur a ouvir, compreender e ajudar. O horário dizia que outra paciente precisava entrar. Laura se foi, logo voltaria para outra sessão, e até lá, Arthur imaginava o quanto era difícil encontrar alguém que mesmo longe, mesmo afastado, quem sabe afastado até pra sempre, mantinha o pensamento naquele que um dia foi e sempre será... Sua superfície. 

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